sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Impulsos do armário

Depois de muito tempo sem escrever, vejo-me pronto a, mais uma vez, discutir a situação daqueles que, como eu, se encontram entre uma camiseta e outra. Meu armário tem me dado tanto trabalho... E por falar nisso, como é difícil para nós nos mantermos no armário, uma vez que nossos impulsos podem, muitas vezes falar mais forte do que gostaríamos, não?

Mantemo-nos sob a proteção do anonimato por nos preocuparmos em não fazer alarde de nossa condição sexual, não por medo, ou covardia, mas por mera opção de discrição. Não temos a necessidade de nos explicarmos para a sociedade como um todo, visto que as pessoas que nos são queridas nos conhecem por inteiro (e nisso inclui-se a sexualidade, bem como os sonhos, os anseios, medos e tudo o quê permeia nossas vidas). Nos vemos como pessoas normais - não que os de fora do armário não o sejam, mas estes fizeram a opção de explicitar sua condição sexual, motivo único que nos difere destes. E como pessoas normais, temos nossos desejos, dos mais variados, os quais não têm hora nem local para se manifestar. Diante disso, como controlar determinados impulsos naturais diante da situação de se estar no armário? Ok, alguém irá nos dizer " você apenas reprime tais impulsos em prol da sua "reputação". Parece fácil, não é? Talvez o seja para os que em sua vida profissional lidem com máquinas ou animais... mas para os que têm de lidar com gente, a situação é bem mais complexa.

Imagine as seguintes situações:

- Caminhando pela rua, repentinamente depara-se com um rapaz de ótimo porte físico, rosto atraente e aparentemente charmoso. A reação normal é querer segui-lo com os olhos ao vê-lo passar. O pescoço tende a se deslocar em direção a este, chegando a se virar quando este passa em direção oposta à nossa. Daí, vêm os seguintes pensamentos:

1. Se me virem olhando pro rapaz podem gritar "vead*!"
2. Se algum conhecido me vir olhando pro rapaz estou uma má situação!
3. Se o rapaz perceber e não gostar do olhar, ele pode querer tirar satisfações comigo a respeito da paquera, ou seja, briga a caminho (etc...).

O que fazer? Simplesmente evitar olhar com cobiça... mas há como disfarçar a admiração que a beleza alheia nos causa? Vale a pena tanto esforço pra não ser percebido enquanto homossexual? Para nós que queremos ou precisamos do armário, responder a essas questões é fundamental para que se decida em prosseguir ou não no armário, ou, até mesmo, para se encontrar mecanismos de sobrevivência no armário.

O exemplo dado foi um dos mais simples possível, embora seja também amplamente corriqueiro. Serve para ilustrar fatos cotidianos de todos nós, o que nos alerta a respeito de nosso posicionamento diante das pessoas com as quais convivemos. Uma vez que queremos manter nossa discrição, saber controlar certos impulsos é fundamental. Não digo que deixemos de sentir algo, mas, uma vez que não se trata apenas de questões sexuais, devemos sim estar atentos às coisas que nos podem por à prova, seja no ambiente de trabalho, com nossos amigos ou, até mesmo em casa, com nossas famílias. O negócio é levar uma bateria extra para a lanterna, porque há muito o que se esconder no armário.

sexta-feira, 25 de junho de 2010

Meias e Sapatos

Ao organizar meu armário percebi que precisava escolher bem o local onde poria minhas meias e meus sapatos. Como sou bem organizado, organizo ambos por cor e por estilo, bem como pela minha preferência - os sapatos e as meias que uso estão sempre a mão. Isto me remeteu a outra organização, muitas vezes difícil pra quem está no armário: onde ir e, principalmente, onde NÃO ir.

Parece-nos claro que, uma vez no armário, a pessoa está destinada a viver distante de qualquer lugar que represente risco à sua imagem, como um super herói que protege ao máximo a sua identidade secreta. Contudo, constrói-se um paradoxo. Em sendo homossexual, como e onde se vai encontrar um outro rapaz a fim de vivenciar qualquer experiência entre dois homens?

A internet parece ser a primeira opção, uma vez que se pode omitir ao máximo a identidade, ficando, assim, um pouco mais seguro. Omite-se tanta coisa que nem se sabe ao certo com quem se está falando, mas isso é papo pra um outro dia... A questão aqui é que na internet também não se está tão seguro assim como se poderia pensar.

Daí advém outra questão: ir ou não a ambientes gays? Muitos têm a curiosidade a respeito de como são estes locais e de como se comportam os homens em total liberdade de expressão de sua sexualidade. Contudo, corre-se o risco de descobrir que aquele seu amigo da faculdade que sai com uma amiga sua é gay, ou que o seu vizinho, aquele mesmo, o barrigudinho calvo que é pai da sua ex-namorada do jardim de infância, dança Bad Romance sem camisa no queijo da boate... Mas aí vem o pior pensamento: "eu posso até vê-los, mas e se algum deles me vir???"

Parece que este texto serviu mais para suscitar questões que ajudar a esclarece-las. Mas elucidar uma questão é algo que surge a partir de seu questionamento. E, em se tratando do humano, jamais haverá uma resposta que sirva para todas as pessoas. Cada um de nós tem seus armários, suas meias e seus sapatos. Nem sempre calçamos o mesmo número e, mesmo que calcemos, as vezes os sapatos dos quais gostamos não agradam aos nossos amigos e vice-versa.

Cabe a cada um de nós escolher se se arrisca ou não nos ambientes gays, sobrevive ou não às infinitas buscas na internet ou tenta omitir dentro de si o desejo de estar com outro homem. Seja qual escolha fizermos, devemos fazê-la conscientes de seus respectivos resultados.

Estar no armário e buscar onde ir realmente nos assemelha a situação que vive o super herói. A proteção de sua identidade o obriga a vestir-se com um uniforme e a usar uma máscara. E aparecer na boate faria com que minha máscara caísse... Mas daí advém outra questão. A palavra 'Personalidade' por sua origem está muito relacionada com a aparência externa da pessoa. Ela descreve e determina características próprias a cada um e que significa exatamente isso, "máscara". (a palavra vêm das máscaras gregas do teatro...) Então ficamos entre viver a nossa própria persona ou criar uma outra, que nos permite viver bem em sociedade e, de vez em quando, nos transformarmos no super herói que nos salva de nós mesmos e da hipocrisia da sociedade que nos cerca. E assim seguimos organizando em nossos armários, nossas meias, sapatos, vendo que meia combina com o sapato escolhido para um determinado compromisso e, além disso, evitando ao máximo que calos se alojem em nossos pés.

sábado, 22 de maio de 2010

"Arruma o armário, menino!"

"Arruma o armário, menino!" minha mãe gritou quando viu que meu armário não andava tão organizado como antigamente. E de fato eu precisava arrumar meu armário. Só que minha mãe não sabia que ela era um dos motivos de meu armário estar tão abarrotado...

Imagine o que é para um rapaz de mais de vinte anos viver com insinuações e ameaças a respeito de sua sexualidade? Crescer numa família de pensamento tradicional é vantajoso no que diz respeito aos cuidados com os estudos, uma boa alimentação, com a criação de uma rotina saudável na infância... mas no tocante a sexualidade, ou melhor, a homossexualidade, uma família tradicional é uma prisão domiciliar...
Por amor a minha família, por autoproteção, sempre desejei não ser homossexual. Aceitava ser um HSH (homem que faz sexo com homem) por aceitar essa conduta apenas como um tesão passageiro.. "Emoção? Amar outro homem? Não comigo!" Até que comecei minha vida sexual e vi que desejava mais do que sexo esporádico com outro homem. Daí desejei uma bissexualidade... " uma dieta balanceada permite uma vida mais saudável, diria qualquer nutricionista." Mas, mesmo amando as mulheres e sabendo que poderia sim fazer sexo com elas, o que fazia meu sangue ferver, minha pele arrepiar e minha boca secar era um homem. Não falo em esteriótipos de homem, mas num homem puro em essência... cheiro de homem, pele de homem, voz de homem, toque de homem. Nem tudo isso eu encontrava no mesmo homem, mas homens distintos me chamavam a atenção por motivos distintos. Quando eu já conseguia me confortar com a idéia de ser bissexual, veio um homem e me desestabilizou. Estava eu apaixonado. E o pior, não poderia mais me enganar com paliativos emocionais: finalmente eu me entendera e aceitara como homossexual.
Mas o pior estava por vir. Como viver minha (homos)sexualidade sem minha família saber? Sei que, homofóbica como minha família é, jamais me aceitaria. Então reccoro à intenete. Encontros, desencontros, reencontros... idas à "casas de amigos fazer trabalhos para a faculdade". Nunca fiz tantos seminários em minha vida! Se cada encontro meu fosse um trabalho universitário, eu me formaria em três cursos distintos além do meu.
Então, vem novamente minha mãe me chamar para arrumar meu armário. "Deixa que eu te ajudo a arrumar o armário, menino!" Se ela soubesse o que esse menino guarda dentro do armário...

Apresentando: Arrumando o Armário

Como anda o seu armário? Bem organizado ou há nele muito a ser remexido, limpo, consertado ou, até mesmo, jogado fora? Bem... se você pensa que este é mais um blog sobre cuidados do lar ou economia doméstica, você se enganou!
Neste blog teremos a discussão de temas relacionados ao mundo homossexual, mas da perspectiva daqueles que têm por opção não revelar sua sexualidade em público, ou seja: o armário. A nossa intensão é mostrar que não somente a covardia é motivo para que se fique no armário, mas também há a opção de ficarmos dentro dele. Partimos do princípio de que não precisamos militar num campo de batalha para termos nossos direitos (homos)sexuais respeitados e preservados. Podemos também fazer a nossa parte a partir do anonimato. De forma alguma pretendemos renegar a grande contribuição daqueles que militaram e dos que ainda militam contra a homofobia, buscando igualdade e direito à cidadania homossexual. A questão aqui é outra. Pretendemos sim levar à tona o pensamento, o estilo de vida e os gostos daqueles que pretendem levar uma vida mais discreta e, mesmo assim, não menos envolvente ou emocionante. A partir de nossas reflexões sobre o nosso "MODVS VIVENDI", você perceberá que "há muito mais entre um cabide e outro do que imagina a nossa vã filosofia".
Deste modo, resta-nos começar a discutir a sexualidade, bem como os outros assuntos a ela ligados, sob o ponto de vista de um homossexual no armário. E, por que não também o daqueles que julgam a nós que estamos nele? Afinal, o olhar do outro sempre nos dá impressões que o nosso próprio olhar é incapaz de captar...
Assim, aqui nos propomos a arrumar o nosso armário. Já estamos com os nossos cabides em mãos, separando meias de cuecas, gravatas, calças jeans e aguardando a sua ajuda nessa arrumação. Quem sabe nesse meio tempo, entre um texto e outro, não arrumamos o seu armário também?

Abraços e até bem breve!

Hangerboy.