sexta-feira, 27 de maio de 2011

O que (não) vestir?


O que fazer quando se tem um amigo adorável, daqueles com os quais se pode contar a qualquer momento, do tipo que se considera como irmão (muitas vezes mais do que um irmão biológico), mas este ameaça sua vida de cabideiro, quero dizer, de morador do armário? Pois é, meus caros, andar na moda certa dá trabalho!
A que me refiro quando digo "andar na moda certa"? Para quem está no armário, andar na moda certa tem a ver com usar trajes discretos, sóbrios, que não lhe atraiam a atenção no sentido de levantar qualquer desconfiança sobre quem de fato se é. E o que tem as nossas amizades a ver com isso? Tudo!
Um amigo que "dê pinta" seria uma calça saruel, que dependendo do nivel de afetação do amigo, pode ser o mesmo que vestir uma saruel de cetim azul turquesa neon. Daí faço a seguinte pergunta: vale a pena deixar um amigo de lado pela manutenção de uma imagem social?
Pois é... saímos à noite, vamos para um barzinho com os amigos e lá vem aquela figura com uma calça jeans skinny de um stretch tão apertado que mais parece uma segunda pele. Você pede a Deus e a todos os santos que conheça -muitas vezes até canoniza alguns - para que ele não venha à sua mesa. Mas, corroborando a lei de Murphy (que não é o Eddie), segundo a qual " se algo tem alguma probabilidade de dar errado, este algo dará errado", seu amigo colorido vem à sua mesa.

- Inhaííí! Tá boua, quiridam?
-Sim..., Adalberto, estou bem. E tia Luzia, como está? Mande um beijo pra ela, ok?
-Tá bom, bee. Agora quenda que vou dar pinta noutra frequezia porque vi um bofe ali que tem um ocani que é odaraaaa!
-Vá lá, Adalberto. Se cuida...

Seus amigos, que já estão morrendo de rir passam a caçoar demais de você por conhecer uma figura tão excêntrica quanto o Adalberto.

-Que bom! Antes assim do que pensando que eu também sou gay.

"Quem é a libélula saltitante, hein?"
- É meu primo, Adalberto (respondo para ter uma explicação plausível da relação com a figura purpurinada - afinal, familia não se escolhe. Acontece!). E assim se consegue um subterfúgio para desviar a homossexualidade e localizá-la apenas no ícone que Carl Gustav Jung, fazendo uso das teorias de Émile Durkheim, chamaria de "máscara social", que no caso vem a ser a do homossexual afeminado.

Mas o que fazer se o Adalberto for uma das melhores pessoas do mundo?
Naquela mesma noite, saindo do bar, meus amigos trêbados de tanta cerveja, mal sabiam com que carro haviam saido. Eu sóbrio, dirigiria o carro, como, sempre. Para nossa surpresa, somos atacados por dois bandidos com facas, querendo os celulares, as carteiras, os relógios... quando, eis que surge Adalberto:

-Êêêê(..)êêêpa! Larga os bofes em paz, guerélho!
-Ihhh.. a-lá o veado... crente que é macho... haha
-Sou macho o suficiente para lhe dar voz de prisão! As duas presas agoraaam!

Pois é... o Adalberto tem, além de nome de macho, profissão de macho e atitude de macho. Depois de sair em nossa defesa contra dois bandidos armados com facas, imobilizá-los e prendê-los, a "libélula saltitante" foi promovida a "Betão".

É curioso como os trejeitos dele passaram a não fazer qualquer diferença depois de ele ter mostrado seu valor, hein?

Pois é... optei, eu, por não usar a calça saruel, mas sim uma gravata de cetim azul turquesa. Nada neon, mas não porque tenho medo do que vão pensar, mas sim porque não tem nada a ver comigo. Embora enquanto seres sociais a opinião alheia, querendo ou não, interfira em nosso cotidiano, ela não pode definir quem somos, com quem andamos ou o que vestimos.

Sim, andar na moda dá trabalho... mas cada um sabe a cor que lhe cai bem!

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Sapatos Silenciosos

Pois é...
Depois de uma longa caminhada silenciosa, volto eu ao nosso bom e querido armário.
Neste momento, dispo-me de uma tentativa frustrada de relacionamento e, adivinhem por que o bendito não deu certo? Por causa do armário! Minha dor e minha delícia tem o mesmo nome! Por conta disso, retomo minhas atividades em escrita, a fim de retomar, ainda mais inflamado pelos últimos acontecimentos, a discussão do armário e de suas implicações.

Há, como já discutimos anteriormente, dois tipos mínimos de armário: aquele no qual se escondem os covardes, que, por medo de se assumirem para a sociedade, evitam pensar em sua própria realidade, escondendo-a de todos e, muitas vezes, de si mesmos; aquele no qual se hospedam pessoas que, por mera opção de discrição, não vêem a necessidade de expor sua sexualidade para a sociedade como um todo.
Enquanto eu me hospedo no segundo tipo de armário, meu ex-algoz é praticamente o construtor em massa do primeiro. E ao construí-lo, destruiu a possibilidade de ser verdadeiramente amado...

Conhecemo-nos num dos famosos guetos, nos quais se encontram tanto ícones da comunidade abertamente gay, quanto aqueles que, por falta de opção discreta para vivenciar sua (homo)sexualidade, acabam se aventurando e, eventualmente, expondo-se à crises de consciência. "O que eu fui fazer num lugar desses, meu pai..." "isso não é ambiente pra mim..."

A figura me seduziu com um caminhar que parecia me chamar pra dentro de si... Tanto que eu, acompanhado na boate, deixei meu acompanhante para ficar buscá-la. O beijo levou a um amasso, que levou à um hotel, que levou-nos à vontade de continuar vendo no que tudo iria dar.

Veio o primeiro encontro, o segundo, e dentre eles a descoberta que o nome e a idade do bendito eram falso. Era ele apenas 3 anos mais velho que eu, porém, considerando os loucos que podemos encontrar pelo caminho, até relevei a mentira auto-protetora.
O problema é que estas mentiras vieram acompanhadas de outras, como estado civil, profissão, endereço... Dormia eu com o inimigo e não sabia?

Veio, com a minha descoberta o desmascarar do homem da máscara de aço e do coração de ferro. Sua frieza em, mesmo diante das provas, seguir insultando minha inteligência e fingir não saber de quem aqueles documentos comprovando sua culpabilidade se tratavam, foi pungente. Acordava eu de um sonho que sonhara sozinho.

Curiosamente, ao encontrá-lo por acaso de volta a um desses guetos (por coincidência, o mesmo do primeiro encontro) meus olhos se abriram ao vê-lo e perceber o que todos os meus amigos me disseram logo após saberem do fim do relacionamento: "sinceramente, não sei o que você fazia com ele...".

Sua desculpa para tamanha mentira era o medo de ser descoberto por sua família e perder o seu respeito, bem como deixar de fazer parte de seu seio. A questão até explica, mas não justifica. Ainda mais diante de alguém que lhe abrira não só as páginas de seu livro, mas também lhe permitira escrever junto a si a história caso desejasse...

Contudo, como diz o ditado, não há bem que sempre dure, nem mal que nunca acabe (ou coisa assim. Depois de algumas caminhadas silenciosas, a fim de não acordar os demais, volto eu à meu ritmo normal, calçando os sapatos de corrida, ouvindo uma boa música, e de volta à maratona. E quem chegar por último, é porque não estava bem alongado (porque essa história de que padre não tem mulher é algo para ser discutido pelo Vaticano!)!

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Impulsos do armário

Depois de muito tempo sem escrever, vejo-me pronto a, mais uma vez, discutir a situação daqueles que, como eu, se encontram entre uma camiseta e outra. Meu armário tem me dado tanto trabalho... E por falar nisso, como é difícil para nós nos mantermos no armário, uma vez que nossos impulsos podem, muitas vezes falar mais forte do que gostaríamos, não?

Mantemo-nos sob a proteção do anonimato por nos preocuparmos em não fazer alarde de nossa condição sexual, não por medo, ou covardia, mas por mera opção de discrição. Não temos a necessidade de nos explicarmos para a sociedade como um todo, visto que as pessoas que nos são queridas nos conhecem por inteiro (e nisso inclui-se a sexualidade, bem como os sonhos, os anseios, medos e tudo o quê permeia nossas vidas). Nos vemos como pessoas normais - não que os de fora do armário não o sejam, mas estes fizeram a opção de explicitar sua condição sexual, motivo único que nos difere destes. E como pessoas normais, temos nossos desejos, dos mais variados, os quais não têm hora nem local para se manifestar. Diante disso, como controlar determinados impulsos naturais diante da situação de se estar no armário? Ok, alguém irá nos dizer " você apenas reprime tais impulsos em prol da sua "reputação". Parece fácil, não é? Talvez o seja para os que em sua vida profissional lidem com máquinas ou animais... mas para os que têm de lidar com gente, a situação é bem mais complexa.

Imagine as seguintes situações:

- Caminhando pela rua, repentinamente depara-se com um rapaz de ótimo porte físico, rosto atraente e aparentemente charmoso. A reação normal é querer segui-lo com os olhos ao vê-lo passar. O pescoço tende a se deslocar em direção a este, chegando a se virar quando este passa em direção oposta à nossa. Daí, vêm os seguintes pensamentos:

1. Se me virem olhando pro rapaz podem gritar "vead*!"
2. Se algum conhecido me vir olhando pro rapaz estou uma má situação!
3. Se o rapaz perceber e não gostar do olhar, ele pode querer tirar satisfações comigo a respeito da paquera, ou seja, briga a caminho (etc...).

O que fazer? Simplesmente evitar olhar com cobiça... mas há como disfarçar a admiração que a beleza alheia nos causa? Vale a pena tanto esforço pra não ser percebido enquanto homossexual? Para nós que queremos ou precisamos do armário, responder a essas questões é fundamental para que se decida em prosseguir ou não no armário, ou, até mesmo, para se encontrar mecanismos de sobrevivência no armário.

O exemplo dado foi um dos mais simples possível, embora seja também amplamente corriqueiro. Serve para ilustrar fatos cotidianos de todos nós, o que nos alerta a respeito de nosso posicionamento diante das pessoas com as quais convivemos. Uma vez que queremos manter nossa discrição, saber controlar certos impulsos é fundamental. Não digo que deixemos de sentir algo, mas, uma vez que não se trata apenas de questões sexuais, devemos sim estar atentos às coisas que nos podem por à prova, seja no ambiente de trabalho, com nossos amigos ou, até mesmo em casa, com nossas famílias. O negócio é levar uma bateria extra para a lanterna, porque há muito o que se esconder no armário.

sexta-feira, 25 de junho de 2010

Meias e Sapatos

Ao organizar meu armário percebi que precisava escolher bem o local onde poria minhas meias e meus sapatos. Como sou bem organizado, organizo ambos por cor e por estilo, bem como pela minha preferência - os sapatos e as meias que uso estão sempre a mão. Isto me remeteu a outra organização, muitas vezes difícil pra quem está no armário: onde ir e, principalmente, onde NÃO ir.

Parece-nos claro que, uma vez no armário, a pessoa está destinada a viver distante de qualquer lugar que represente risco à sua imagem, como um super herói que protege ao máximo a sua identidade secreta. Contudo, constrói-se um paradoxo. Em sendo homossexual, como e onde se vai encontrar um outro rapaz a fim de vivenciar qualquer experiência entre dois homens?

A internet parece ser a primeira opção, uma vez que se pode omitir ao máximo a identidade, ficando, assim, um pouco mais seguro. Omite-se tanta coisa que nem se sabe ao certo com quem se está falando, mas isso é papo pra um outro dia... A questão aqui é que na internet também não se está tão seguro assim como se poderia pensar.

Daí advém outra questão: ir ou não a ambientes gays? Muitos têm a curiosidade a respeito de como são estes locais e de como se comportam os homens em total liberdade de expressão de sua sexualidade. Contudo, corre-se o risco de descobrir que aquele seu amigo da faculdade que sai com uma amiga sua é gay, ou que o seu vizinho, aquele mesmo, o barrigudinho calvo que é pai da sua ex-namorada do jardim de infância, dança Bad Romance sem camisa no queijo da boate... Mas aí vem o pior pensamento: "eu posso até vê-los, mas e se algum deles me vir???"

Parece que este texto serviu mais para suscitar questões que ajudar a esclarece-las. Mas elucidar uma questão é algo que surge a partir de seu questionamento. E, em se tratando do humano, jamais haverá uma resposta que sirva para todas as pessoas. Cada um de nós tem seus armários, suas meias e seus sapatos. Nem sempre calçamos o mesmo número e, mesmo que calcemos, as vezes os sapatos dos quais gostamos não agradam aos nossos amigos e vice-versa.

Cabe a cada um de nós escolher se se arrisca ou não nos ambientes gays, sobrevive ou não às infinitas buscas na internet ou tenta omitir dentro de si o desejo de estar com outro homem. Seja qual escolha fizermos, devemos fazê-la conscientes de seus respectivos resultados.

Estar no armário e buscar onde ir realmente nos assemelha a situação que vive o super herói. A proteção de sua identidade o obriga a vestir-se com um uniforme e a usar uma máscara. E aparecer na boate faria com que minha máscara caísse... Mas daí advém outra questão. A palavra 'Personalidade' por sua origem está muito relacionada com a aparência externa da pessoa. Ela descreve e determina características próprias a cada um e que significa exatamente isso, "máscara". (a palavra vêm das máscaras gregas do teatro...) Então ficamos entre viver a nossa própria persona ou criar uma outra, que nos permite viver bem em sociedade e, de vez em quando, nos transformarmos no super herói que nos salva de nós mesmos e da hipocrisia da sociedade que nos cerca. E assim seguimos organizando em nossos armários, nossas meias, sapatos, vendo que meia combina com o sapato escolhido para um determinado compromisso e, além disso, evitando ao máximo que calos se alojem em nossos pés.

sábado, 22 de maio de 2010

"Arruma o armário, menino!"

"Arruma o armário, menino!" minha mãe gritou quando viu que meu armário não andava tão organizado como antigamente. E de fato eu precisava arrumar meu armário. Só que minha mãe não sabia que ela era um dos motivos de meu armário estar tão abarrotado...

Imagine o que é para um rapaz de mais de vinte anos viver com insinuações e ameaças a respeito de sua sexualidade? Crescer numa família de pensamento tradicional é vantajoso no que diz respeito aos cuidados com os estudos, uma boa alimentação, com a criação de uma rotina saudável na infância... mas no tocante a sexualidade, ou melhor, a homossexualidade, uma família tradicional é uma prisão domiciliar...
Por amor a minha família, por autoproteção, sempre desejei não ser homossexual. Aceitava ser um HSH (homem que faz sexo com homem) por aceitar essa conduta apenas como um tesão passageiro.. "Emoção? Amar outro homem? Não comigo!" Até que comecei minha vida sexual e vi que desejava mais do que sexo esporádico com outro homem. Daí desejei uma bissexualidade... " uma dieta balanceada permite uma vida mais saudável, diria qualquer nutricionista." Mas, mesmo amando as mulheres e sabendo que poderia sim fazer sexo com elas, o que fazia meu sangue ferver, minha pele arrepiar e minha boca secar era um homem. Não falo em esteriótipos de homem, mas num homem puro em essência... cheiro de homem, pele de homem, voz de homem, toque de homem. Nem tudo isso eu encontrava no mesmo homem, mas homens distintos me chamavam a atenção por motivos distintos. Quando eu já conseguia me confortar com a idéia de ser bissexual, veio um homem e me desestabilizou. Estava eu apaixonado. E o pior, não poderia mais me enganar com paliativos emocionais: finalmente eu me entendera e aceitara como homossexual.
Mas o pior estava por vir. Como viver minha (homos)sexualidade sem minha família saber? Sei que, homofóbica como minha família é, jamais me aceitaria. Então reccoro à intenete. Encontros, desencontros, reencontros... idas à "casas de amigos fazer trabalhos para a faculdade". Nunca fiz tantos seminários em minha vida! Se cada encontro meu fosse um trabalho universitário, eu me formaria em três cursos distintos além do meu.
Então, vem novamente minha mãe me chamar para arrumar meu armário. "Deixa que eu te ajudo a arrumar o armário, menino!" Se ela soubesse o que esse menino guarda dentro do armário...

Apresentando: Arrumando o Armário

Como anda o seu armário? Bem organizado ou há nele muito a ser remexido, limpo, consertado ou, até mesmo, jogado fora? Bem... se você pensa que este é mais um blog sobre cuidados do lar ou economia doméstica, você se enganou!
Neste blog teremos a discussão de temas relacionados ao mundo homossexual, mas da perspectiva daqueles que têm por opção não revelar sua sexualidade em público, ou seja: o armário. A nossa intensão é mostrar que não somente a covardia é motivo para que se fique no armário, mas também há a opção de ficarmos dentro dele. Partimos do princípio de que não precisamos militar num campo de batalha para termos nossos direitos (homos)sexuais respeitados e preservados. Podemos também fazer a nossa parte a partir do anonimato. De forma alguma pretendemos renegar a grande contribuição daqueles que militaram e dos que ainda militam contra a homofobia, buscando igualdade e direito à cidadania homossexual. A questão aqui é outra. Pretendemos sim levar à tona o pensamento, o estilo de vida e os gostos daqueles que pretendem levar uma vida mais discreta e, mesmo assim, não menos envolvente ou emocionante. A partir de nossas reflexões sobre o nosso "MODVS VIVENDI", você perceberá que "há muito mais entre um cabide e outro do que imagina a nossa vã filosofia".
Deste modo, resta-nos começar a discutir a sexualidade, bem como os outros assuntos a ela ligados, sob o ponto de vista de um homossexual no armário. E, por que não também o daqueles que julgam a nós que estamos nele? Afinal, o olhar do outro sempre nos dá impressões que o nosso próprio olhar é incapaz de captar...
Assim, aqui nos propomos a arrumar o nosso armário. Já estamos com os nossos cabides em mãos, separando meias de cuecas, gravatas, calças jeans e aguardando a sua ajuda nessa arrumação. Quem sabe nesse meio tempo, entre um texto e outro, não arrumamos o seu armário também?

Abraços e até bem breve!

Hangerboy.